domingo, 5 de fevereiro de 2012

"A expressão desenvolvimento sustentável representa uma armadilha do sistema imperante: assume os termos da ecologia (sustentabilidade) para esvaziá-los. Assume o ideal da economia (crescimento) mascarando, a pobreza que ele mesmo produz."

Do Portal Adital

Desenvolvimento sustentável: crítica ao modelo padrão 
Leonardo Boff
Teólogo, filósofo e escritor

Os documentos oficiais da ONU e também o atual borrador para a Rio+20 encamparam o modelo padrão de desenvolvimento sustentável: deve ser economicamente viável, socialmente justo e ambientalmente correto. É o famoso tripé chamado de Triple Botton Line (a linha das três pilastras), criado em 1990 pelo britânico John Elkington, fundador da ONG SustainAbility. Esse modelo não resiste a uma crítica séria.

Desenvolvimento economicamente viável: Na linguagem política dos governos e das empresas, desenvolvimento equivale ao Produto Interno Bruto (PIB). Ai da empresa e do país que não ostentem taxas positivas de crescimento anuais! Entram em crise ou em recessão com conseqüente diminuição do consumo e geração de desemprego: no mundo dos negócios, o negócio é ganhar dinheiro, com o menor investimento possível, com a máxima rentabilidade possível, com a concorrência mais forte possível e no menor tempo possível.

Quando falamos aqui de desenvolvimento não é qualquer um, mas o realmente existente que é aquele industrialista/capitalista/consumista. Este é antropocêntrico, contraditório e equivocado. Explico-me.

É antropocêntrico pois está centrado somente no ser humano, como se não existisse a comunidade de vida (flora e fauna e outros organismos vivos) que também precisa da biosfera e demanda igualmente sustentabilidade. É contraditório, pois, desenvolvimento e sustentabilidade obedecem a lógicas que se contrapõem. O desenvolvimento realmente existente é linear, crescente, explora a natureza e privilegia a acumulação privada. É a economia política de viés capitalista. A categoria sustentabilidade, ao contrário, provém das ciências da vida e da ecologia, cuja lógica é circular e includente. Representa a tendência dos ecossistemas ao equilíbrio dinâmico, à interdependência e à cooperação de todos com todos. Como se depreende: são lógicas que se autonegam: uma privilegia o indivíduo, a outra o coletivo, uma enfatiza a competição, a outra a cooperação, uma a evolução do mais apto, a outra a co-evolução de todos interconectados.

É equivocado, porque alega que a pobreza é causa da degradação ecológica. Portanto: quanto menos pobreza, mais desenvolvimento sustentável haveria e menos degradação, o que é equivocado. Analisando, porém, criticamente, as causas reais da pobreza e da degradação da natureza, vê-se que resultam, não exclusiva, mas principalmente, do tipo de desenvolvimento praticado. É ele que produz degradação, pois dilapida a natureza, paga baixos salários e gera assim pobreza.

A expressão desenvolvimento sustentável representa uma armadilha do sistema imperante: assume os termos da ecologia (sustentabilidade) para esvaziá-los. Assume o ideal da economia (crescimento) mascarando, a pobreza que ele mesmo produz.

Socialmente justo: se há uma coisa que o atual desenvolvimento industrial/capitalista não pode dizer de si mesmo é que seja socialmente justo. Se assim fosse não haveria 1,4 bilhões de famintos no mundo e a maioria das nações na pobreza. Fiquemos apenas com o caso do Brasil. O Atlas Social do Brasil de 2010 (IPEA) refere que cinco mil famílias controlam 46% do PIB. O governo repassa anualmente 125 bilhões de reais ao sistema financeiro para pagar com juros os empréstimos feitos e aplica apenas 40 bilhões para os programas sociais que beneficiam as grandes maiorias pobres Tudo isso denuncia a falsidade da retórica de um desenvolvimento socialmente justo, impossível dentro do atual paradigma econômico.

Ambientalmente correto: O atual tipo de desenvolvimento se faz movendo uma guerra irrefreável contra Gaia, arrancando dela tudo o que lhe for útil e objeto de lucro, especialmente, para aquelas minorias que controlam o processo. Em menos de quarenta anos, segundo o Índice Planeta Vivo da ONU (2010) a biodiversidade global sofreu uma queda de 30%. Apenas de 1998 para cá houve um salto de 35% nas emissões de gases de efeito estufa. Ao invés de falarmos nos limites do crescimento melhor faríamos falar nos limites da agressão à Terra.

Em conclusão, o modelo padrão de desenvolvimento que se quer sustentável, é retórico. Aqui e acolá se verificam avanços na produção de baixo carbono, na utilização de energias alternativas, no reflorestamento de regiões degradadas e na criação de melhores sumidouros de dejetos. Mas reparemos bem: tudo é realizado desde que não se afetem os lucros, nem se enfraqueça a competição. Aqui a utilização da expressão "desenvolvimento sustentável”possui uma significação política importante: representa uma maneira hábil de desviar a atenção para a mudança necessária de paradigma econômico se quisermos uma real sustentabilidade. Dentro do atual, a sustentabilidade é ou localizada ou inexistente.



O direito e não o mercado.

Via Conteúdo Livre

Janaína Penalva - A venda de órgãos‏


O direito, e não o mercado, regula os transplantes no sistema de doações

Janaína Penalva


Doutora em direito constitucional, professora da Universidade de Brasília, pesquisadora do Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero (Anis)

Ganhou repercussão a premiação de uma pesquisa realizada na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) que sustenta que um mercado lícito e regulado de órgãos e tecidos poderia ser uma alternativa eficiente ao modelo atual de doação de órgãos. Nas entrevistas publicadas (EM, Saúde, 30/1/2012), os autores dizem que a proibição do comércio de órgãos funda-se em uma visão moral de cunho religioso que sacraliza o corpo e desconsidera a autonomia dos indivíduos. Outro ponto levantado pelo estudo é que a regulação alteraria um cenário internacional preocupante de comércio ilegal de órgãos. Em síntese, trocaríamos um mercado negro por um mercado regulado, que, sensível à lei da oferta e da procura, aumentaria o número de órgãos e, portanto, de transplantes. O estudo se engana na definição das razões pelas quais nosso sistema rejeita o comércio de órgãos ou tecidos. Não vendemos órgãos porque rejeitamos o dinheiro como critério de justiça. O sistema de saúde brasileiro é público e universal. Isso significa que todos os brasileiros – ricos e pobres – têm exatamente os mesmos direitos frente ao Sistema Único de Saúde (SUS), garantidos na medida de suas necessidades médicas.



Quem regula os transplantes no sistema de doação é o direito e não o mercado. Um mercado lícito de órgãos pode ser uma proposta perversa, já que reduziria a escassez não apenas pelo eventual aumento no número de órgãos disponíveis para o transplante, mas, principalmente, pela redução no acesso, agora dependente do poder econômico do receptor. Novamente a ideia de escassez de bens é mal colocada no campo da saúde, um campo que deve ser regulado pelos direitos fundamentais e não pelas leis do mercado. Insistimos na gratuidade porque insistimos na universalidade do acesso à saúde. Os baixos índices de doação de órgãos podem ser alterados por políticas que criem um sistema integrado eficiente e transmitam confiança aos doadores. Essa confiança depende de uma regulação eficiente e de um esclarecimento público constante sobre como são feitos os transplantes e quais são os resultados para a saúde e vida dos receptores e doadores.


A doação intervivos é uma possibilidade segura para os doadores em alguns casos e deve ser incentivada e esclarecida. A Espanha é um país com índices altíssimos de transplante de órgãos e um exemplo interessante de que a garantia de universalidade em saúde pode ser realizada em um sistema público. Soluções intermediárias que garantissem que apenas os pobres tivessem acesso público aos transplantes nesse sugerido mercado lícito de órgãos é uma solução pior não apenas porque violaria a universalidade do SUS, mas por razões mais pragmáticas como a criação de duas filas de espera de órgãos e duas categorias de pacientes, os públicos e os privados. Além dos critérios de urgência e compatibilidade na definição dos transplantes, somaríamos o critério econômico e teríamos um sistema de saúde funcionando como um leilão de bens. Engana-se quem pensa que um mercado de órgãos é uma esperança. Como todas as sugestões de privatização da saúde, um mercado de órgãos é uma solução inconstitucional, além de ser um franco retrocesso no processo brasileiro de garantia dos direitos sociais.

domingo, 29 de janeiro de 2012

‘Cidades Sustentáveis: Um novo modelo de desenvolvimento é o que se busca

Do Reportagens CarbonoBrasil

Um novo modelo de desenvolvimento é o que se busca

27/01/2012   -   Autor: Fernanda B. Mûller   -   Fonte: Instituto CarbonoBrasil

As cidades, abrigando 85% da população brasileira e mais de 50% da global, são os locais mais apropriados para discutir e construir um novo paradigma para a sociedade alcançar o verdadeiro desenvolvimento sustentável e superar as crises atuais


O Fórum Social Temático (FST), realizado na cidade de Porto Alegre, recebeu o seminário ‘Cidades Sustentáveis’ e congregou um grupo seleto de palestrantes que se entregou à discussão do que é de fato a sustentabilidade.
Tanto a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, quanto Jorge Abrahão, presidente do Instituto Ethos, ressaltaram que nos encontramos em meio a diversas crises: social, financeira, ambiental, mas principalmente ética.
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E neste momento, ressalta Abrahão, é que podemos buscar os caminhos para construir juntos as diretrizes de um novo paradigma para a sociedade. “É uma grande oportunidade, é o que a Rio +20 deve nos oferecer”.
Para ele, uma das razões da crise atual é o nosso imaginário: individualista e de curto prazo. A falta de visão de longo prazo se tornou generalizada, entre o Estado, empresas e cidadãos e para agravar ainda mais, o setor corporativo passou a ser maior que muitos Estados, trazendo o interesse privado para o foco da gestão pública, comentou Abrahão.
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Neste sentido, Marina sugere que o ideal do desenvolvimento sustentável precisa ter suas bases em uma nova forma de ‘Ser’. Há que se resolver todas essas crises que vivemos sem perder o foco que tudo surge de uma única crise, o “impasse civilizatório”, completa a ambientalista.
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Ela defende que a solução está no desapego de conceitos arraigados, ou em uma “descontinuidade produtiva”, primeiramente reduzindo o consumo, logo após isso inserindo novas fontes na matriz energética.
“A realidade responde na língua que é perguntada, nós é que somos monoglotas”, diz Marina se referindo a nossa necessidade de pensar outras formas de se viver que não seja a perpetuação do modelo depredatório atual.
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A participação da sociedade é um requisito elementar para a construção de um novo modelo, um exemplo é o Movimento Nossa São Paulo, que a partir do compromisso do atual prefeito Kassab com o programa ‘Cidades Sustentáveis’ criou uma série de mais de 200 metas e indicadores, segundo Abrahão.
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Com o sentimento da população que as metas não estavam sendo atendidas, a mídia iniciou um trabalho de pressão sobre o prefeito que resultou em uma queda na sua aprovação popular.

Afinal o que é sustentabilidade?
O novo modelo para a nossa sociedade até poderia ser o que vem sendo chamado de ‘capitalismo verde’, porém aprofundando um pouco mais as raízes deste conceito surgem questionamentos se isto realmente é possível.
Em seu novo livro ‘ Sustentabilidade – O que é e o que não é’, o Teólogo Leonardo Boff busca desvendar este termo às vezes tão mal empregado.
A sustentabilidade é “facilmente usada como adjetivo e não como substantivo”, confronta Boff explicando que as empresas focam na competitividade e atualização, mas não enxergam as injustiças sociais, degradação ambiental e o modo de ser que ajudam a perpetuar.
Em sua análise, Boff não encontrou sequer uma definição da ONU que inclua algo além do homem em seu cerne.
“A crise do modelo vigente, que põe o homem fora e acima da natureza levou a um impasse, a idéia era ter um desenvolvimento infinito e hoje nos damos conta que já encostamos nos limites ... a saída é buscar um novo paradigma, que já tem um século de discussão nas ciências da vida, física quântica e tantas outras”.
Como exemplo de modelo a se seguir ele indica a ‘Carta da Terra’ http://www.cartadaterrabrasil.org/, resultado de uma década de diálogo intercultural, em torno de objetivos comuns e valores compartilhados.
A missão da Iniciativa da Carta da Terra é promover a transição para formas sustentáveis de vida e de uma sociedade global fundamentada em um modelo de ética compartilhada, que inclui o respeito e o cuidado pela comunidade da vida, a integridade ecológica, a democracia e uma cultura de paz.
À luz desta legitimidade, um crescente número de juristas internacionais reconhece que a Carta da Terra está adquirindo um status de lei branca (“soft law”). Leis brancas, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos são consideradas como moralmente, mas não juridicamente obrigatórias para os Governos de Estado, que aceitam subscrevê-las e adotá-las, e muitas vezes servem de base para o desenvolvimento de uma lei stritu senso (hard law).
"(Um novo começo) requer uma mudança na mente e no coração. Requer um novo sentido de interdependência global e de responsabilidade universal", conclama a Carta da Terra.

Novo modelo
Em vários debates do FST, os 'capitalismo verde' foi alvo de duras criticas.
Veterano do movimento socioambientalista brasileiro, presente na Rio-92 há 20 anos, Jean-Pierre Leroy revela uma preocupação: “O discurso da economia verde chega com uma força muito grande, como se fosse a única alternativa para o futuro. O problema é que aqueles que esmagaram os povos e estragaram os territórios são os mesmos que se apresentam como a solução do problema ambiental. Mas, a gente pergunta o que eles fizeram desde a Rio-92, e a resposta é nada. Não resolveram nada nesses 20 anos e vão resolver agora para o futuro? Esse discurso foi adotado pelos economistas e pela tecnocracia, e não há um debate social sobre isso. Ou se propõe outro modelo econômico ou essa economia, mesmo esverdeada, não tem futuro”, diz.

Rio+20
Tudo indica que os debates devem esquentar ainda mais durante a realização da Rio +20, quando também será realizada a Cúpula dos Povos, evento paralelo organizado pela sociedade civil que até agora já tem confirmada a presença de cerca de 10 mil pessoas.
Mal o ano começou e as críticas a conferência da ONU já são muitas. Tasso Azevedo, ex-diretor de Florestas do Ministério do Meio Ambiente, disse que o documento divulgado pelas Nações Unidas, que esboça a resolução a ser votada na conferência, é “certinho”.
“Existindo ou não, não faz diferença hoje”, comentou enfatizando que o texto apresenta extrema dificuldade em lidar com a realidade que há limites para o nosso crescimento. Outro defeito, segundo ele, é a conexão entre pobreza e desenvolvimento sustentável, sendo que o texto coloca a primeira como condicionante do último. O documento também não lida com o tema das desigualdades sociais, critica.
“Tenho minhas dúvidas que os chefes de estado do G8 darão importância à Rio +20”, enfatizou Carlos Alberto Libânio Christo, o Frei Betto, conclamando a sociedade a pressionar os líderes a comparecer.
Ele diz que a conferência deve ser um grande evento de mobilização social, mas que lembra que este ano outro evento importante merece atenção da população: as eleições municipais.
“Temos que detonar crescente o preconceito que devemos torcer o nariz para a política. Quem tem nojo de política é governado por quem não tem”, ressalta sugerindo que cada um de nós faça uma pauta de compromisso para ser cobrada dos candidatos eleitos.

“Se a gente não participa as coisas não acontecem”, convocou o economista Ladislau Dowbor.
Vídeo: Cobertura da marcha de abertura do Fórum Social Mundial, em Porto Alegre / #florestafazadiferenca #vetadilma!

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Invisibilidade (des)humana

Do Tijolaço

Assisti, nos telejornais da manhã, várias reportagens sobre as manifestações pelos direitos dos animais, no domingo ensolarado.
Bem, muito bem, porque maus-tratos a animais é sinal de desumanidade.
Mas não vi nenhuma matéria sobre a pesquisa do Dieese que mostra como os garis sofrem discriminações por limparem a sujeira que eu, você e o mais ilustre quatrocentão paulistano fazemos todo dia em nossas cidades. Mais de um quilo por dia cada pessoa, segundo as estatísticas.
Nenhuma, exceto a do repórter Uirá Machado, na Folha, um trabalho que só poderia ser feito com a sensibilidade de um jornalista que os vê como seres humanos.
Infelizmente, Uirá não tem o prestígio público de um Boris Casoy, que desdenha de que possam dizer algo de útil e verdadeiro “do alto de suas vassoras”.
Mas deu gosto ver a profissão exercida com sentido de humanidade, por gente que é capaz de entender o velho poema de Manoel Bandeira:
Vi ontem um bicho/Na imundície do pátio/Catando comida entre os detritos.Quando achava alguma coisa,Não examinava nem cheirava: Engolia com voracidade.O bicho não era um cão,Não era um gato, Não era um rato.O bicho, meu Deus, era um homem.
Nunca vi um gari matratando um mendigo que lhe espalhasse, em busca de comida, o lixo que teria de recolher. Uma praguejada, um palavrão, mas jamais os ouvi pedirem tropa de choque para expulsar os que têm de tirar do monturo o quase nada para viver.
Mas já vi muito desembargador botando a polícia  para correr com pobre de sua humilde casinha, onde não está na rua, feito bicho abandonado.
E não os vi cuidando com o mesmo vigor que criança não viva de bicho abandonado, porque isso ofende uma ordem social civilizada.
Os garis, estes homens que recolhem a nossa irresponsabilidade com o planeta, não são invisíveis, ao contrário do que diz a matéria de Uirá.
Muitos de nós, os graúdos, de mente atilada e sabedoria pedante, é que somos cegos.

sábado, 21 de janeiro de 2012

Lei reforça competência dos órgãos ambientais

Do Jornal Valor Econômico

Novo cenário com a Lei Complementar 140

Autor(es): Sérgio Guerra
Valor Econômico - 20/01/2012
 
Era consenso que o país precisava ter uma definição do Poder Legislativo - e não do Judiciário, como vem ocorrendo insatisfatoriamente - sobre as competências dos entes federados em matéria ambiental (União, Estados, Distrito Federal e Municípios). O caminho mais eficaz seria a regulamentação do parágrafo único do artigo 23 da Constituição de 1988 que outorga competência comum a todos os entes federados para adotar ações necessárias à proteção do ambiente.
Finalmente, após 23 anos foi promulgada em 8 de dezembro a Lei Complementar (LC) nº 140, fixando normas para a cooperação nas ações administrativas decorrentes do exercício dessa competência relativa à proteção do ambiente. Bastante aguardada, a pergunta passa a ser se a nova lei possui elementos suficientes para equacionar as dúvidas e reduzir riscos e litígios acerca dos limites de atuação dos órgãos ambientais.
A norma legal ataca os pontos nevrálgicos: a falta de uma postura cooperativa, consensual e transparente entre os próprios órgãos e entre estes e os empreendedores; e a ausência da análise objetiva dos custos e benefícios (equilíbrio entre desenvolvimento e preservação). Merecem louvores os objetivos fundamentais previstos na LC 140 para os órgãos ambientais: a atuação descentralizada, democrática e eficiente; a harmonização de políticas administrativas para se evitar a sobreposição de atuação entre os entes federativos, evitando conflitos de atribuições; e a garantia de uniformidade da política ambiental nacional, respeitadas as peculiaridades regionais e locais.
Quanto aos instrumentos jurídicos para se alcançar a desejada cooperação institucional, a lei apresenta alguns modelos tradicionais, além de uma comissão tripartite (nacional e estadual) e uma comissão bipartite do Distrito Federal. De todos os aspectos disciplinados, destaque-se na lei a distribuição de competências entre os entes federativos.
A nova lei define e reforça a competência dos órgãos ambientais
Acerca do licenciamento sob a responsabilidade da União (leia-se, Ibama), as competências ficaram mais claras e, de certa forma, reduzidas. Compreende os empreendimentos localizados ou desenvolvidos conjuntamente no Brasil e em país limítrofe; no mar territorial; na plataforma continental ou na zona econômica exclusiva; em terras indígenas; em unidades de conservação instituídas pela União; em dois ou mais Estados; de caráter militar e os relativos a material radioativo ou que utilizem energia nuclear.
Aos municípios coube a competência sobre atividades ou empreendimentos que causem ou possam causar impacto ambiental de âmbito local. Por ser um conceito indeterminado, dando margem a interpretações casuísticas, a lei prevê que a atuação municipal deverá ser definida pelos conselhos estaduais de meio ambiente, que considerarão os critérios de porte, potencial poluidor e natureza da atividade.
Como já estabelecia a Lei nº 6.938, de 1981, coube aos Estados a maior fatia da competência em matéria ambiental, esvaziando, de certa forma, a atuação do Ibama. Além de interferir na definição das competências municipais (dizer o que é interesse e impacto local), compete ao Estado a competência residual, aquelas que não estejam conferidas à União nem aos municípios.
Um dos dispositivos mais relevantes da LC 140/11, voltado ao devido processo legal, assegura que os empreendimentos e atividades serão licenciados, ambientalmente, por um único ente federativo. Essa definição já existia em norma expedida pelo Conama (Resolução nº 237, de 1997); contudo não era observada diante de flagrante inconstitucionalidade.
Em havendo interesse dos demais entes federados, os mesmos só poderão se manifestar dirigindo-se ao órgão responsável pela licença, e essa manifestação não será vinculante. Ou seja, a LC 140 visa acabar com os múltiplos processos de licenciamento ambiental.
A lei também traz a procedimentalização da competência supletiva. Quando decorrer o prazo para o licenciamento e o mesmo não estiver concluído, outro órgão ambiental - ou o Conselho do Meio Ambiente - poderá desempenhar as ações administrativas pendentes.
A lei assegura que, em havendo fiscalizações e autuações administrativas simultâneas por suposto descumprimento das normas ambientais, prevalecerá o auto de infração lavrado pelo órgão que detenha a competência para o licenciamento.
A LC 140, se não resolve todos os problemas vivenciados por aqueles que militam na área do direito administrativo e ambiental baliza, ao menos, importantes princípios da ação estatal para o licenciamento de empreendimentos e atividades potencialmente poluidoras.
A nova lei define e reforça a competência dos órgãos ambientais, trazendo, em certa medida, segurança jurídica para a sociedade e para os servidores públicos constantemente acusados de improbidade administrativa ainda que apliquem a lei; unifica o procedimento administrativo de licenciamento ambiental, favorecendo o devido processo legal; e reduz espaços para abusos de agentes estatais sob o rótulo da vetusta e incontrolável discricionariedade administrativa.
Sérgio Guerra é pós-doutor em administração pública pela FGV/Ebape e professor titular de direito administrativo da FGV Direito Rio
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Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Que bom celebrar a história num local de conquistas!

Do Portal Adital
Lutar vale à pena

Selvino Heck
Assessor Especial da Secretaria Geral da Presidência da República
Adital

"Enfrentamos duras batalhas para não perdermos nossas terras. Depois vimos que, se não lutássemos, seríamos jogados em qualquer canto pelas empresas, sem nenhum direito. Que bom celebrar a história num local de conquistas! Lutamos e buscamos esta terra juntos. Além da terra, tínhamos que buscar as condições para as famílias gerarem renda e agregar valor à produção. Nesse sentido, acessamos muitos programas, entre eles o Programa de Aquisição de Alimentos, através do qual entregamos a nossa produção, os PAIS, e construímos a micro-destilaria e a agroindústria. Estas experiências estão viabilizando a permanência dos agricultores na região e queremos levá-las para todo Brasil.” São as palavras de Cleonira de Almeida, moradora do reassentamento São Francisco de Assis, como dizia na placa ‘uma conquista do Movimento dos Atingidos por Barragens', nas comemorações dos 20 anos do MAB, no interior de Esmeralda, Rio Grande do Sul.

Os campos ondulados, cheios de plantações e de verde que se veem, 360 graus, do alto da coxilha onde fica o Ginásio da Comunidade São Francisco, dão um sentimento de tranqüilidade e paz às centenas de pessoas presentes na festa de comemoração. A alegria e o sentimento do dever cumprido estavam estampados no rosto de todas e todos. E não revelavam as dores de anos atrás, a separação obrigatória da terra, da casa e da comunidade de origem por causa da construção das barragens de Itá e Machadinho no Rio Uruguai, o sofrimento da partida, das lembranças e da infância que ficaram.

O dia era 17 de dezembro de 2011. O convite dizia: "Ilmo. Sr. Selvino Heck. O Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB - comemora neste ano '20 ANOS DE LUTAS E CONQUISTAS'. A história dos Atingidos pro Barragens tem sido de lutas, organização e também celebração de nossas conquistas. Nesse ano de 2011 completamos 20 anos de organização do MAB nacional e 30 anos de organização dos Atingidos por Barragens na Bacia do Rio Uruguai. Queremos celebrar esse momento importante de nossa história, contando com a participação de organizações e pessoas lutadoras que têm nos ajudado a construir o MAB. Na oportunidade também será feita a inauguração de um Programa de Produção Agro-ecológica integrada sustentável – PAIS -, com o intuito de representar o resultado das conquistas.”

O dia era de festa, em primeiro lugar. Mas as palavras de ordem do Movimento ecoaram, braços e punhos no ar, a dizer que a luta continua: Água e energia não são mercadoria. Águas para a vida, não para a morte.

Gilberto Carvalho, Ministro-Chefe da Secretaria Geral da Presidência da República, enviou uma mensagem: "Quero enviar a vocês um forte e fraternal abraço, em meu nome e em nome da presidenta Dilma Rousseff. Para mim, é motivo de muita alegria ter podido testemunhar, ao longo desses anos, as conquistas e consolidação do MAB, especialmente no âmbito da organização e formação de seus militantes, defendendo direitos fundamentais para aqueles que mais precisam. O governo federal recebeu uma extensa pauta de reivindicações, que está sendo objeto de negociações e encaminhamentos. O Movimento participa da negociação em torno da Plataforma Operário-camponesa de Energia, que já conseguiu pautar e abrir o debate com o governo sobre o modelo energético brasileiro, num tema em que há muito a avançar.” Termina o ministro Gilberto: "É papel do movimento criticar, cobrar, reivindicar e monitorar a execução das políticas públicas. Mas temos um sonho em comum. Se pedimos a confiança em nossos propósitos, queremos continuar sendo desafiados pela persistência e pelo vigor da luta de vocês por um Brasil muito melhor.”

Em nome do MAB nacional, Gilberto Cervinski encerrou o ato político: "O MAB se consolidou enquanto movimento nacional por sua estratégia de ação, mas também pelos apoios que teve e parcerias e alianças que fez. Se o Movimento tem grandes amigos, tem também grandes inimigos, que o Movimento enfrentou e enfrenta com bravura, sem nunca ter dúvida de que lado se posicionar. As conquistas do MAB não vieram das mesas de negociação, mas porque o povo sempre esteve em movimento, lutando para a garantia dos direitos.”

Como eu disse na minha fala, antes de ler a carta do ministro Gilberto: "Lutar vale a pena”.

E como ninguém é de ferro, ainda mais em solo gaúcho, o ato e a festa terminaram numa grande churrascada oferecida pelos moradores do reassentamento, com direito a bolo de aniversário e apresentações culturais do Antônio Gringo e cantadores populares.

Lei que altera CLT, sancionada pela presidente Dilma, acaba com distinção entre trabalho dentro da empresa e à distância

Via Portal Nassif

As novas tecnologias na legislação trabalhista

Da Folha de S. Paulo
Lei que altera CLT, sancionada pela presidente Dilma, acaba com distinção entre trabalho dentro da empresa e à distância
Advogados entendem que funcionário possa receber adicional por trabalho com mensagens fora do expediente
MAELI PRADO
PRISCILLA OLIVEIRA
DE BRASÍLIA
Em tempos de popularização dos smartphones, uma lei que acaba com a distinção entre trabalho dentro da empresa e à distância, sancionada pela presidente Dilma Rousseff no final de 2011, já gera polêmica entre empregados e empregadores.
A legislação, que alterou a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), diz que o uso de celular ou e-mail para contato entre empresas e funcionários equivale, para fins jurídicos, às ordens dadas diretamente aos empregados.
p>De acordo com advogados especializados, a mudança abre espaço para que funcionários que usam o celular para trabalhar após o horário de expediente, por exemplo, recebam horas extras por isso.
Até agora, a legislação trabalhista colocava no mesmo patamar o trabalho no escritório e o feito de casa, mas não mencionava o uso de tecnologias que permitem que o funcionário possa produzir onde quer que esteja.
"A CLT foi promulgada em 1943, quando não havia os meios de comunicação atuais", diz a advogada trabalhista Aparecida Hashimoto, do Granadeiro Guimarães Advogados. "Mesmo que o funcionário atenda uma ligação por cinco minutos, ele está trabalhando. Deveria ter direito a receber."
É uma interpretação oposta à de entidades empresariais, como a CNI (Confederação Nacional da Indústria), que rebatem que o objetivo do projeto de lei do deputado Eduardo Valente, de 2004, que deu origem à mudança da CLT, era somente regular o trabalho à distância.
Ou seja, quando o funcionário tem acesso remoto inclusive ao sistema da empresa. "Para nós essa interpretação foi uma surpresa, porque o objeto, o sentido da lei era regular, garantir segurança, e não gerar insegurança", afirma Emerson Casali, gerente-executivo de Relações do Trabalho e Desenvolvimento Associativo da CNI.
REVISÃO
A mudança na legislação já faz com que o TST (Tribunal Superior do Trabalho) considere revisar uma súmula, de maio do ano passado, que estabelece que o uso de pagers ou celulares corporativos não caracteriza o "regime de sobreaviso".
Se o funcionário está de sobreaviso, a lei determina que a empresa pague a ele um terço do valor que desembolsaria na hora do expediente.
Com a alteração na CLT, o tribunal trabalha com três cenários possíveis para revisar a jurisprudência.
A primeira seria considerar o pagamento por regime de sobreaviso, um terço da hora trabalhada. A segunda seria considerar o contato via e-mail ou celular como hora normal de trabalho, e a terceira seria manter a súmula e não pagar nada a mais